Quem me acompanha sabe que sou um entusiasta da ideia de sinergia entre compostos de planta, um conceito tão difundido no meio da fitoterapia, e particularmente debatido no âmbito da Cannabis medicinal. O conceito é tão atrativo quanto difícil de demonstrar, e para os mais rigorosos em farmacologia, o termo “sinergia” chega a dar arrepios, porque para prová-lo de verdade, praticamente você precisa demonstrar que consegue fazer a soma de 1+1 resultar em 3 (ou mais).
Esse mês um artigo chamou bastante atenção da comunidade canabinoide por ter supostamente cravado uma conclusão definitiva e com evidência direta da interação entre terpenos e canabinoides. Contudo, o artigo não é livre de críticas; embora descreva um fenômeno real, há quem argumente que não se trata de um fenômeno clinicamente relevante.
E realmente o artigo não entre neste mérito da aplicação clínica. Primeiro, porque se trata de uma abordagem bem de laboratório, combinando experimentos in vitro (em células) e in vivo (em roedores), e mesmo combinando terpenos com canabinoides que não são originalmente encontrados na natureza.
A primeira descoberta interessante é que alguns terpenos são, por si só, canabimiméticos. O que isso quer dizer? Que eles ativam diretamente algum mecanismo associado ao sistema endocanabinoide.
A primeira descoberta interessante é que alguns terpenos são, por si só, canabimiméticos. O que isso quer dizer? Que eles ativam diretamente algum mecanismo associado ao sistema endocanabinoide.
Pelo menos quando falamos dos terpenos α-Humuleno, β-Pineno, Linalol e Geraniol fica evidente que:
O β-Cariofileno já se sabia que é um agonista canabinoide tipo CB2 com efeito anti-inflamatório, então não é novidade que ele também responda. Eu senti falta do mirceno, que é um importante terpeno presente na Cannabis e também já foi associado a efeitos analgésicos.
Honestamente, eu sou do tipo que torce o nariz quando vejo alguém se referindo aos “terpenos” assim em geral e atribuindo a eles um determinado efeito de interesse médico. Digo isso porque é bastante ingênuo pensar que todos eles possuem um perfil farmacológico idêntico.
Aqui vemos claramente que este é o caso: os terpenos são obviamente diferentes entre si, com diferentes potencias e efeitos. Então, declarar qualquer coisa a respeito de “terpenos” generalizando, ou é falta de informação ou, digamos, entusiasmo exagerado pelo tema.
Este não foi o primeiro estudo a investigar este tema, mas foi o primeiro a descrever a interação direta entre terpenos e canabinoides, e particularmente, associá-lo a um mecanismo particular.
Diria que estamos caminhando para uma compreensão melhor do fenômeno, e que pode ser mesmo no nível dos receptores canabinoides, ao contrário do que muitos pensavam. A questão ainda permanece aberta, minha conclusão é que o fenômeno em si foi descrito inequivocamente, é real, mas a relevância pros efeitos da Cannabis em si da forma como é consumida por pacientes ou usuários ainda precisa ser melhor estabelecida.
Vamos seguir acompanhando esta fronteira da ciência, ainda tem muita coisa interessante por vir.
Fonte: https://sechat.com.br/esta-comprovado-terpenos-e-canabinoides-interagem-diretamente-com-mecanismo-canabinoide/ Data: 29/04/2021.